terça-feira, 24 de junho de 2008

O REINO DE VALDECACOS


Estou a escrever em dia de eleições para a presidência no partido laranja no condado Portucalense. Aqui no reino de Valdecacos, onde por meras questões de vaidade e politiquice, a comissão politica local transferiu o apoio da Baronesa da Tanga Dona Manuela Azeda o Leite para o Visconde de Vila Real Dom Passos Coelhone, nota-se um movimento desusado de pessoas. Constou-me que o número de eleitores inscritos com capacidade para votar, passou de cerca de 250 há um ano atrás nas eleições que opuseram o Visconde de Gaia Dom Filipe Às Vezes ao Gandanóia , para mais de 500 na actualidade. Quem andou a pagar as quotas aos militantes? E com que fim? Todos sabemos porquê e eu não resisto em transcrever um texto escrito no século XIX por Júlio Dinis e cuja actualidade nos envergonha a todos no reino de Valdecacos.

“Atrás vinham os eleitores de Pinchões, velhos e moços, ricos e pobres, mas todos com o olhar tímido e estúpido, todos com movimentos enleados, todos com os olhos no caudilho, para saber o que deviam fazer; se ele parava a cumprimentar um amigo, paravam todos com ele; a direcção que tomava, tomavam-na todos a um tempo; apressavam ou demoravam o passo, segundo a velocidade que ele dava aos seus; se ria, sorriam; se praguejava, tudo ficava sério. O cortejo parou à porta da igreja. O morgado passou revista à sua tropa, à qual deu instruções. Os homens, com os cabelos para diante dos olhos, os braços estendidos e a cabeça baixa, não ousavam fazer um movimento e conservaram-se enfileirados até nova ordem do Sr.Joãozinho. Pareciam envergonhados de serem precisos a alguém. No bolso de cada um destes homens havia um oitavo de papel almaço dobrado, no qual estava escrito um nome; um nome de um homem que eles nem sabiam se existia no mundo. No momento devido, cada um deles, chamado pela voz do escrutinador eleitoral, respondia "presente" ; aproximar-se-ia da urna, entregaria ao presidente da mesa aquele papel e retirar-se-ia satisfeito, como se descarregado de um peso que o oprimia. Se lhes perguntassem o que tinham feito, qual o alcance daquele acto que acabavam de executar, não sabiam dizê-lo; se lhes perguntassem o nome do eleito para advogado dos seus interesses e defensor das sua liberdades, a mesma ignorância; se lhes propusessem a resignação do direito de votar, aceitariam com júbilo; se, finalmente, lhes dissessem que naquele dia estavam nas suas mãos e dos seus pares os destinos do país, abririam os olhos de espantados, ou sorririam com a desconfiança própria dos ignorantes.Inocente povo! Querem-te assim os ambiciosos, a quem serves de cómodo degrau.”

Até Breve


Publicado no jornal"Tribuna Valpacense" em 10 de Junho de 2008