segunda-feira, 28 de novembro de 2011

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Soube há pouco tempo que aquando da visita do Barão de Boliqueime Dom Regressado Silva ao reino de Valdecacos para inaugurar o agrupamento escolar, estaria prevista uma manifestação com cartazes empunhados por alguns ex-trabalhadores do hospital, mostrando o seu descontentamento pelo encerramento do mesmo, com todas as consequências negativas que daí vieram para as populações e também pela perda do posto de trabalho numa época de crise em que o desemprego aumenta assustadoramente.
Soube também que os cartazes acabaram por não aparecer por pressões várias do Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum, para quem pelos vistos, o direito à indignação e à manifestação do desagrado pela perda de um equipamento fundamental para o povo como era o hospital é menos importante que a imagem idílica, prosaica e cordata das criancinhas a bater palmas, num esquema ensaiado por professores e políticos que me fez lembrar as visitas do finado Almirante Américo Tomás, não faltando no fim da cerimónia um opíparo almoço para as entidades, pois ao contrario do sol, a crise quando nasce não é para todos.
Não houve um só ano desde a revolução de Abril, em que a dívida do condado Portucalense e de todos os reinos que o compõem não tivesse aumentado, encontrando-nos neste momento a braços com a maior crise de sempre. Os políticos, todos eles, gastaram o que tinham e o que não tinham, e quantos mais anos passaram no poder mais gastaram. Tanto no poder central como no poder local.
Quem não conhece obras faraónicas, obras desnecessárias, subsídios mal atribuídos, subsídios não aplicados na finalidade com que foram obtidos, ordenados chorudos, senhas de presença principescamente pagas por empresas públicas, viagens sumptuosas, carros topo de gama, assessorias mal justificadas e pagas a peso de ouro, etc. etc.  etc.
Pois agora o discurso politicamente correcto é o discurso da poupança e o nosso chefe do governo Dom Xico Mirandum, numa de bom aluno perante o afamado professor de finanças, lá foi dizendo que deixando as aldeias do reino às escuras durante a noite já conseguiu poupar 11 milhões de euros.
Essa quantia, daria para construir e equipar em excelente hospital que não temos.
Daria para construir um complexo de piscinas com parque de campismo e um mini Zoológico na zona da Freixeda, sonho antigo das gentes de Valdecacos, e que não temos.
Daria para apoiar a criação de empresas de transformação na indústria agro-alimentar (castanha, figo, frutos secos, azeitonas, compotas, etc.), criando emprego e fixando pessoas, mas que também não temos.
Daria para adquirir, reconstruir e conservar o pouco património histórico e arquitectónico do reino que se encontra ao abandono…
Daria para apoiar a criação de explorações familiares de porco bísaro, certificando o fumeiro como se faz no vizinho reino de Vinhais, criando emprego e fixando pessoas nas suas aldeias, fumeiro que entra na elaboração do folar que apesar de tantas feiras ainda não saiu da cepa torta.
Daria para construir de raiz uma escola profissional com cursos credíveis e virados para o mercado de trabalho, que também não temos…
Daria para construir e equipar o pólo universitário do Instituto Politécnico de Bragança, promessa não cumprida de uma campanha eleitoral, com protocolo assinado e tudo, mas que não temos…
Então para que serviram os 11 milhões de poupança? Estarão na Caixa a render? Ou serviram apenas politicas eleitoralistas que mantiveram no poder a mesma força política nos últimos 30 anos?
As cortes do condado Portucalense elegeram para sua presidente a Baronesa do Terreiro Dona Expropriação Esteves, nada e criada no reino de Valdecacos, jurista com carreira invejável, e que já tinha sido a primeira mulher a exercer funções no Tribunal Constitucional. Tendo já tido um voto de louvor e congratulação aprovado por unanimidade nas cortes de Valdecacos, vai agora presidir à inauguração da Biblioteca do reino. O Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum que dela disse o que o Maomé não disse do toucinho, por causa dos terrenos da zona industrial, em que o governo de Valdecacos foi condenado a pagar um balúrdio, terá agora que dizer o contrário, o que para um político há 30 anos no poder não é nada do outro mundo!!
O Marquês dos Colmeais, Dom Filipe Pratumba, personagem destas crónicas, há alguns anos arredado da vida política, deixou-nos prematuramente, não passando já de saudade, as animadas tertúlias no café Purgatório, com o Barão do Tanque Novo Dom Jota Xitunda, o Marquês de Águas Frias Dom Tino Flávia, o Duque de Manteigas Dom Joselito de La Estrela e Benfica e o Morgado de S. Francisco Dom Catalone El Bone. As suas “bocas” propositadamente destabilizadoras conhecidas como “pratumbadas”, levavam os outros intervenientes a um estado de quase apoplexia, deixando o Marquês de Tinoni Dom Bino Flavia de olhos arregalados atrás do balcão, quando se levantava, risonho a caminho dos Colmeais de melena ao vento, depois de ter provocado a maior das confusões. Imagino-o agora, na restinga do Lobito sentindo a brisa do mar e olhando o por do sol ímpar daquele rincão africano que ele tanto amava.

Até Breve
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 04 de Novembro de 2011

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

CRÓNICAS DO REINO SÉRIE IV


Lá se passaram as mais importantes festas do reino de Valdecacos, ou seja, as festas da Sr.ª da Saúde, que durante mais de 60 anos foram feitas e geridas pelo povo, característica essa que lhes conferia uma genuinidade impar, mas com o passar dos anos, por passividade, ingenuidade ou mesmo cumplicidade do próprio povo (ou pelo menos parte dele), foram completamente subvertidas e são agora dominadas pelo clero e pela nobreza, transformando-se numa mera manifestação de manipulação e poder.

No último dia de Agosto em plena semana das festas do reino de Valdecacos, numa atitude de completa subalternização ao vizinho reino de Mirandum, que tinha tido as suas festas como habitualmente no primeiro domingo de Agosto cheias de pompa e circunstancia, pois no dia 31 de Agosto a capital do reino de Mirandum teve lá a televisão do estado durante várias horas no programa “Verão total” com actuação de vários artistas sendo a cereja no cimo do bolo o famoso Dom Toni das Carreiras, a nós nesse mesmo dia mandaram-nos cá o filhito Dom Miguelito das Carreiras, para dar inicio ao programa que nos acompanha todo o ano e que é a “Pasmaceira Total”.

A procissão onde os sentimentos de recolhimento, fé, esperança e caridade estão cada vez mais ausentes, mais parece um desfile político-militar como os que havia do 1º de Outubro na praça vermelha em Moscovo no tempo do Brejnev.

Tive o cuidado de acompanhar a procissão e pude observar com estes que a terra há-de comer, o Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum ser cumprimentado e retribuindo por pessoas colocadas ao longo do trajecto pelo menos umas 700 vezes, eles eram amigos, correligionários, subsidiados, compadres, favorecidos, desempregados e afins…

O presidente das Cortes Dom Juanito de La Bisabuela lançando olhares furtivos à esquerda e à direita e com a cara circunstancial que ele tão bem sabe fazer, iria provavelmente ruminando a ideia de que os tempos de destaque e de abundância estão a terminar…

O Marquês de Calavinhos Dom Milkes Varredor provavelmente sonhando com futuras procissões em que ele será o mais cumprimentado…

O alcaide de Valdecacos e Marquês de Piscaneto Dom Zé Generoso, cogitando nas dificuldades que terá em estender uma vitória eleitoral a todo o reino, ultrapassando as fronteiras da capital…

Surpresa das surpresas a presença do Duque de Manteigas, Dom Joselito de La Estrela e Benfica. Ninguém me tira da cabeça que estará a preparar a candidatura à alcaideria de Valdecacos, provavelmente contando acima de tudo com o apoio dos benfiquistas pois os rosas estão na mó de baixo…

Se é certo que os andores não são mísseis, embora algumas beatas discutam entre si a potencia o alcance e o custo de cada um dos santos, dizei-me lá se isto não parece um desfile político-militar!!

O presidente do Condado Portucalense, esteve no reino de Valdecacos a inaugurar as novas instalações do agrupamento escolar. Excelentes instalações diga-se de passagem, decididas, financiadas e quase totalmente executadas durante o governo do Visconde de Vilar de Maçada Dom Zé Trócaste. Não sei se alguém nos discursos e na assistência teve uma palavra de agradecimento ou sequer se lembrou dele, julgo que não, como vedes a vida tem destas coisas difíceis de explicar e de entender. Um cartaz empenhado por dois corajosos velhotes, alertava o Barão de Boliqueime Dom Regressado Silva, que não é só de rotundas, centro escolar, e monumentos que se faz uma cidade. Para a grande maioria dos habitantes do reino, idosos e com pouca mobilidade o encerramento do hospital foi a mãe de todas a tragédias.

Se o povo do Condado Portucalense treme com a chegada dos elementos da Troika, que obriga o nosso governo a fazer-nos todas estas maldades, nós no reino de Valdecacos temos a Troika da Confraria, ou seja, o Marquês de Alfarelos, filho Del Rei Dom João VI, o Marquês de Viagreta Dom Geninho Três Ais e o Conde de La Bodega Dom Gualter de Los Jamones, cujo poder pelos vistos ultrapassa o do governo de Dom Xico Mirandum, das cortes de Dom Juanito de La Bisabuela, dos médicos liderados pelo Marquês do Pereiro Dom Alfonso de La Niña, dos enfermeiros, dos técnicos, dos trabalhadores, etc etc etc.

Se uma Troika incomoda muita gente, duas Troikas incomodam muito mais. Desgraçado povo do reino de Valdecacos que tanto tens penado e ainda terás que penar.



Até Breve

Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 16 de Setembro de 2011

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE


Ora aí estamos nós, em mais um Agosto do nosso contentamento. As ruas enchem-se de automóveis com matrículas esquisitas, alguns deles verdadeiros topos de gama que nos deixam com a boca aberta de espanto! De janela aberta, braço de fora e musica do Toni Carreira com os decibéis quase no máximo, são os nossos emigrantes, a matar saudades da família, do sol e das paisagens deste jardim à beira mar plantado, do qual o nosso reino também faz parte, embora numa situação um bocado esquecida e periférica, tão esquecida e tão periférica que a água do jardineiro-mor chega cá em escassa quantidade e a pouca que chega é mal distribuída, uns bebem muito e outros quase nada! Como se isto não bastasse ainda existem por aí uns ramais clandestinos, que vão transformando esta parte do jardim longe do mar plantado num autêntico sequeiro, as flores vão estiolando aos milhares, substituídas por um mato seco e rasteiro, que qualquer faísca ou ponta de cigarro transformarão num inferno dantesco para tudo terminar em escombros e em cinzas.
Cinzas, é o que estamos a ver em Londres, capital do reino de Inglaterra, onde a violência e a barbárie saíram à rua pelas mãos da juventude, que normalmente são as mais generosas de todas as mãos! Tão generosas que no reino da Noruega quase oitenta jovens foram imolados em nome de ideias que no mundo ocidental vão grassando e crescendo como a levedura no pão.
Pelas televisões entram-nos diariamente em casa cenas de violência, de fome, de desemprego, de náufragos, de refugiados. Tal como mancha peçonhenta de óleo, a crise alastra pela Europa fora. Agora já não são só os reinos de Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha, os famosos PIGS, que lutam contra a crise, os reinos de Itália e de França já tremem com a especulação dos mercados. Até a América, a maior economia do mundo, deu sinais de fraqueza provocando um crash bolsista, alarmando ainda mais os mercados. O presidente Dom Barraca Abana, homem em que todos depositávamos grandes esperanças, tem-se visto mais grego que os gregos para lidar com a situação. Cá dentro vão-nos limpar metade do subsídio de natal, subiram os transportes e vai subir o IVA, puseram na rua os boys para entrarem “especialistas”, venderam o BPN pelo preço de um jogador de futebol e a culpa não é do Visconde de Vilar de Maçada Dom José Trócaste?
Como é possível haver tanta desgraça no reino Portucalense na Europa no mundo e não há um jornaleco, uma estação de TV ou de rádio ou alguém que lhe aponte o dedo? Estávamos tão habituados a que isso acontecesse e ficávamos tão tranquilos quando ele arcava com as culpas que às tantas todas estas maldades continuam a ter por detrás o dedo do Dom José Trócaste!
Deixemos a Europa o mundo e o Condado Portucalense, regressemos como os emigrantes ao reino de Valdecacos, onde foi recentemente inaugurado um espaço de diversão nocturna, ao qual ainda não tive oportunidade de ir, mas que me disseram estar decorado e apetrechado com o que há de melhor, podendo vir a tornar-se num ponto de referência para toda a região. Ao Marquês da Torralta Dom Teotónio Limões, empresário que se meteu em mais esta aventura, os meus sinceros votos de êxito no empreendimento.
Estamos a menos de um mês das festas da Nossa Sra. da Saúde. Já estou a imaginar a procissão, os andores, as bandas, as autoridades civis e militares, o arcipreste, os acólitos, as figuras, os anjinhos e o povo. Será agora muito mais difícil à Sra. da Saúde fazer milagres estando o hospital fechado. Espero que os responsáveis pelo encerramento, não tenham a desfaçatez e a pouca vergonha de, afivelando a mascara de beatos, acompanharem a procissão da padroeira do hospital. Aos responsáveis religiosos e da comissão de festas, deixo-vos a sugestão de na procissão das velas, quando trouxerem a imagem da Nossa Sra. da Saúde para a igreja matriz, façam um desvio e passem pelo largo do hospital. Quem sabe um milagre não acontece? 



PS: Houve no vizinho reino de Mogadouro um evento publicitado em vários cartazes pendurados nos viadutos que atravessam os itinerários principais, com os seguintes dizeres “REDBURROS FLY IN”. Pois consta-se que estará a ser preparado um evento idêntico para o ano de 2013 no reino de Valdecacos, com o alto patrocínio do Marquês de Piscaneto Dom José Generoso, e que se designará “ORANGEBURROS FLY OUT”.

Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 12 de Agosto de 2011

segunda-feira, 25 de julho de 2011

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Quem vem do Porto pelo IP4, depois de atravessar o reino encantado de Miguel Torga, quando nos aproxima-mos dos reinos de Alijó e da Porca, vemos alguns placards informativos na berma da estrada de cor castanha e tamanho grande com os seguintes dizeres: “ALTO DOURO VINHATEIRO.PATRIMÓNIO MUNDIAL”. Trata-se do reconhecimento por parte da UNESCO do património paisagístico que o homem com força de vontade e de braços vem construindo e preservando há centenas de anos, nos milhares de socalcos que fazem parte da mais antiga região vinícola demarcada do mundo, e cuja exploração em termos turísticos vai de vento em popa.
Pois nas entradas norte, sul, este e oeste do nosso reino, vão ser colocadas placas idênticas com a seguinte informação: “BAIXO VALDECACOS PEPEDEIRO, PATRIMÓNIO MUNDIAL DO CACIQUISMO”.
Há mais de vinte anos que não se via no reino de Valdecacos um cozinhado em “banho-maria”, como o que se viu na eleição para a comissão de pais do agrupamento escolar. O governo de Dom Xico Mirandum resolveu por motivos de estratégia política, dar o beneplácito à lista que apoia o irmão de Dom Caím Conde do Cutelo Melhor. Trata-se dum personagem com cartão laranja, é enteado do presidente das Cortes Dom Juanito de Lá Bisabuela, será uma correia de transmissão do poder, não fazendo grandes ondas e ao mesmo tempo retiram-no da corrida à sucessão de Dom Xico Mirandum, sonho antigo e sempre acalentado pelo próprio, mas que poderia vir lançar mais confusão num processo que se antevê complicado.
O presidente das Cortes Dom Juanito de La Bisabuela meteu ombros à tarefa, convocou os alcaides necessários para angariar e transportar pessoas, requisitou os serviços da irmã do irmão de Dom Caím Conde do Cutelo Melhor, responsável da área social do governo, para fazer umas ameaças ao subsidio-dependentes e aos do rendimento mínimo, e foi um espectáculo digno de se ver, primeiro nas imediações do centro cultural depois dentro da sala, como se de uma autêntica festa tauromáquica se tratasse, as xicoelinas, os passes de peito, os derechazos, as manoletinas e os cabrestos, conduziram os matarruanos, os chavorrêlhos, os bragançanos e os subsidiados às urnas, para votarem numa lista de pais que apoia para director um professor que perdeu as eleições entre os seu pares por quase 80% dos votos.
Como se tudo isso não bastasse houve gente a mais para o tamanho do recinto, houve empurrões, houve insultos, havia gente com bebidas alcoólicas e alguns já bem compostos, enfim foi uma sorte não se ter dado uma tragédia.
Não foram motivos de ordem científica, ou de ordem pedagógica, ou tendo em vista uma maior autonomia da escola, ou qualquer preocupação com o futuro dos alunos que motivaram estas movimentações. Tratou-se apenas de uma demonstração gratuita de poder pelo poder, dum partido que se enquistou e que se julga dono de tudo e de todos, que não tem nada a ver com o partido do Marquês de Vila Real Dom Passos Guedelho, cujas atitudes até à data demonstram abertura à sociedade civil e um corte com os dinossauros e com as politicas do passado. No reino de Valdecacos ainda vigora para mal de todos nós o partido do Visconde de Maricá Dom Espadarte Lima e do Marquês da cidade da Praia Dom Dias Matreiro.
Os responsáveis pelo encerramento do Hospital de Valdecacos, continuam a passear-se no meio de nós com a maior desfaçatez. Até quando vamos permitir que isso aconteça? Esta verdadeira tragédia que aconteceu no nosso reino, provavelmente a maior desde a revolução dos cravos, teve como consequência uma aproximação de posições entre o Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum, e o Marquês do Pereiro Dom Alfonso de La Niña. Esta situação tem provocado um certo alvoroço a alguns elementos da nomenclatura laranja e da “entourage” rosa, tendo em vista os posicionamentos para a próxima corrida eleitoral. Consta-se que um dos mais irritados com esta situação é o Marquês de Alfarelos, filho Del Rei Dom João VI. Aqui há dias ouviram-no comentar referindo-se aos dois personagens supra-citados que “só lhes falta passearem de mão dada”.

Até Breve
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 08 Julho de 2011

sexta-feira, 1 de julho de 2011

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Acabei de assistir ao debate televisivo entre os candidatos laranja e rosa, o último entre os vários debates, que houve entre os candidatos dos principais partidos, que no próximo dia 5 de Junho concorrem às legislativas do condado Portucalense. Quando toda a gente esperava que Dom José Trócas-te, Visconde de Vilar de Maçada, com o traquejo que toda a gente lhe reconhece nestas andanças, dominasse por completo o confronto, o inexperiente em termos governativos Dom Passos Guedelho, Marquês de Vila Real, aguentou-se bem e em alguns momentos chegou a encostar o dirigente rosa às “tábuas”, situação nunca vista em anteriores debates e que poderá representar o arranque dos laranjas rumo à vitória e à mudança que tanto desejam.
Aqui no reino, embora ainda faltem cerca de dois anos para as eleições e a grande maioria dos cabeças de lista para o governo e para as alcaiderias tenha de ser mudada por imperativo da lei, caso contrário ficariam no poleiro até irem “guardar os patos ao gaiato”, com direito a exéquias fúnebres de primeira categoria, oficio incluído, e os estandartes da confraria a acompanhar o cortejo, já começam a ver-se movimentações no partido que dá acesso ao poder, onde a luta poderá ser encarniçada com várias potenciais candidaturas à cadeira há longos anos ocupada pelo Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum.
O Marquês de Calavinhos Dom Milkes Varredor, numero dois do actual executivo, há já longo tempo que vem manifestando esse desejo, aproveitando-se do cargo que ocupa para ir arregimentando apoios em todas as alcaiderias do reino. Foi presidente da assembleia-geral da confraria, provavelmente pensando no apoio da instituição e do status que o cargo lhe daria para suceder ao barão de Ferreiros. Demitiu-se há dias quando viu tudo a arder na confraria por causa da situação do hospital. A demissão foi a meu ver tardia e não evitou que saísse chamuscado.
O Visconde da Arreigada Dom António Barbarrossa, deputado às cortes do reino parece ser outro dos candidatos oficiosos à sucessão do Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum. Tem a marcada desvantagem de não ser natural do reino e de não reunir grandes simpatias no aparelho partidário. Tem a vantagem de ser genro do Marquês de Viladopelo Dom Tetantero, cujo poder e influencia não podem, nem devem ser desvalorizados. Consta-se que terá também o apoio do próprio Barão de Ferreiros, assunto que não pude confirmar, mas que poderá vir a ter uma importância decisiva. Estamos habituados a ouvi-lo tecer rasgadíssimos elogios à acção de Dom Xico Mirandum à frente do governo, sempre antecedidos por excelências e excelentíssimos como convém a um político com pretensões.
Tenho à minha frente uma cópia da acta nº1 de 2011 das cortes do reino que se realizaram em 25-02-2001, e não resisto em transcrever uma parte do discurso de Dom António Barbarrossa, “ O hospital de Valdecacos vai abrir ao público possivelmente até à Pascoa, esperamos todos que o hospital mantenha as várias especialidades, valências e naturalmente os postos de trabalho. Fazemos votos de que se mantenha o serviço de urgências permanente e durante as 24 horas do dia, e assim sendo não será necessário que o povo saia novamente á rua, não serão precisas mais manifestações, tudo voltará à normalidade. Valdecacos deixará de ser noticia e não abrirá nos próximos tempos os telejornais. Não posso deixar de salientar e de sublinhar o papel fundamental de excelentíssimo chefe do governo de Valdecacos em todo este processo, sem a sua intervenção estamos todos certos, o hospital não reabria portas, pelo menos não abriria as suas portas tão rapidamente”.
Como vemos o discurso tem todas as características para um político ter sucesso. Quando mais desfasado da realidade, melhor!
PS: Todos vimos um dos mais poderosos homens do mundo, o director do FMI Dominic Strauss-Khan, acabrunhado, algemado e humilhado a caminho do tribunal de Nova Iorque acusado dum crime de natureza sexual…
Na América a justiça é igual para todos. No condado Portucalense e no reino de Valdecacos é o que se sabe e o que se vê…
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 28 de Maio de 2011
Até Breve

segunda-feira, 9 de maio de 2011

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

A revolução dos cravos faz 37 anos dentro de dias. Eu ainda conheci os tempos tristes da ditadura, do atraso cultural, da pobreza, da censura, da PIDE, da guerra colonial, da emigração a salto, da fome, das manifestações prontamente reprimidas com cargas policiais, do acesso à educação só para alguns, dos ordenados de miséria, dos grandes latifúndios, do trabalho escravo de sol a sol por uma côdea de pão e um quartilho de vinho, da igreja ao lado dos ricos e poderosos, da justiça para poucos, da saúde só para os que podiam pagar, etc. etc…
Foram quase 50 anos que o povo aguentou esse regime saído do golpe de estado do 28 de Maio de 1926, e quando caiu, numa revolução calma e tranquila, praticamente sem tiros, num país em que cerca de 1 milhão de homens tinha passado pelos 13 anos das guerras de África, foi grande a admiração por toda a Europa e pelo mundo, pela maneira civilizada e com poucos sobressaltos com que fizemos a nossa transição para a democracia.
Alguns analistas e historiadores que anos mais tarde escalpelizaram os primeiros anos da nossa revolução, inclusive o PREC, que durante o verão quente de 1975 ia fazendo vacilar a nossa ainda incipiente democracia, são unânimes em afirmar que o regime fascista estava podre, e como a fruta podre cai da árvore ao mais pequeno abanão ou mesmo sem se lhe tocar, também o antigo regime caiu com armas que em vez de tiros dispararam cravos, para alegria e satisfação popular, com imagens que agora se repetem quase 40 anos depois, nalguns reinos do norte de África e do médio oriente.
Aqui no reino de Valdecacos, existe uma confraria cujos dirigentes ainda vêm do tempo do antigo regime, também já apodreceram há muito e ainda não se aperceberam, ou então já deram conta, mas fazem de conta que não deram!
Na ultima reunião das Cortes do reino, todos os deputados e todos os alcaides com excepção do alcaide se Sem Fins que se absteve, votaram a favor duma resolução apresentada pelo Marquês do Pereiro Dom Alfonso de La Niña, em que era pedido ao chefe do governo Dom Xico Mirandum, que se candidatasse a confrade mor pois teria o apoio de todas as forças politicas e de toda a população. Esta solução é por todos apontada como a mais conveniente e provavelmente a única que permitirá a reabertura do Hospital de Valdecacos, assim como garantirá o fim do clima de conflitualidade gerado pela actual mesa administrativa da confraria e que está a por em risco a sobrevivência da própria instituição. Toda a gente entende isto! Só o confrade mor, o vice confrade mor, e os confrades mesários parecem não querer entender!
O povo já saiu à rua por duas vezes e como não há duas sem três, qualquer dia entra pela confraria dentro liderado pelo Marquês de Puralina, Dom Tião Cidade das Neves (daqui lhe tiro o meu chapéu pela coragem e determinação com que defende a causa do Hospital), e tal como a Padeira de Aljubarrota chega-lhes uma pá do forno para expulsar de lá para fora essa gente que tanto mal tem feito ao nosso reino. Porém ao contrário de Dona Brites de Almeida era assim que se chamava a Padeira de Aljubarrota, as padeiras de Valdecacos e eu conheço algumas que já andam a treinar, estão mortinhas por desancar no confrade mor e seu muchachos e voltar a por os Espanhóis no Hospital.
Para terminar deixo-vos uma história que me chegou ao conhecimento, passada no tribunal do reino em que são intervenientes duas personagens que fazem parte destas crónicas, e que não valerá a pena identificar, pois pela qualidade do diálogo os leitores verão logo de quem se trata:
ADVOGADO- Doutor, antes de fazer a autópsia o senhor verificou o pulso da vitima?
PERITO – Não.
ADVOGADO – O senhor verificou a pressão arterial?
PERITO – Não.
ADVOGADO – O senhor verificou a respiração?
PERITO – Não.
ADVOGADO – Então é possível que a vítima estivesse viva quando a autópsia começou?
PERITO – Não.
ADVOGADO – Como é que o senhor pode ter a certeza?
PERITO – Porque o cérebro da vítima estava numa bacia em cima da mesa.
ADVOGADO – Mas ele poderia estar vivo mesmo assim?
PERITO – Sim, é possível que ele estivesse vivo e a tirar o curso de direito nalguma universidade!!!

Até Breve
Publicado no jornal "tribuna Valpacense" em 08 de Abril 2011

segunda-feira, 21 de março de 2011

CRÓNIAS DO REINO IV SÉRIE

Tive um encontro imediato de 3º grau. Decorriam na modorra habitual os últimos dias de Outubro do ano que findou, neste triste reino de velhos e compadrios, perdido no meio das serras duma”jangada de pedra” cujo final de viagem se antevê trágico. De repente uma luz branca e intensa mais brilhante que o sol (onde é que eu já li isto?), entrou na minha cabeça e fragmentou-se em biliões de estrelas cintilantes que me levaram para um mundo com dimensões completamente desconhecidas e estranhas para mim. Contactei com gente de outras galáxias com um nível de conhecimento muitíssimo superior ao nosso, senti uma paz interior e um sentimento de felicidade indescritíveis, estive em locais que vão para além da imaginação, desloquei-me à velocidade do pensamento que é muito superior à da luz, tive a percepção plena como é pequeno o nosso reino e primitivo o nosso mundo.
Durante mais de três meses percorri sistemas estrelares e galáxias inatingíveis, vivi numa dimensão completamente desmaterializada, os extra-terrestres entraram no meu corpo e eu no corpo deles, tenho a vaga ideia de me ter sido implantado um “chip” no cérebro para que a nossa comunicação fosse perfeita, como de facto aconteceu.
Regressei há pouco tempo e tenho estado a recuperar, pois não é fácil voltar a uma existência terrena, num corpo já meio gasto, depois do transcendente encontro imediato de 3º grau. Esta é a explicação pela minha ausência forçada deste contacto que convosco tenho mantido ao longo dos anos.
Foi enorme o meu espanto, quando por motivos de saúde relacionados com a estranha situação que acabei de vos relatar, me dirigi ao hospital de Valdecacos que encontrei encerrado e com enorme cartaz pendurado na fachada com as seguintes parangonas de alto a baixo: “A CONFRARIA QUER ABRIR O HOSPITAL”. Achei estranhíssima a situação e dirigi-me ao Centro de Saúde onde um cartaz ainda maior pendurado na frontaria dizia: “O GOVERNO QUER FECHAR ESTAS INSTALAÇÕES”. Cada vez mais perturbado, caminhei em direcção ao centro da cidade, quando reparei que no edifício da Câmara Municipal também estava pendurado um enorme cartaz de cor rosa com a seguinte mensagem: “O PRESIDENTE FARTO DO PODER QUER QUE OS MUNICIPES VOTEM NA OPOSIÇÃO”. Resolvi então apanhar um táxi para me levar ao serviço de urgências do hospital do reino da Flávia, na esperança de ver o meu problema resolvido, pedi ao taxista para passar na cooperativa do azeite, comprar um garrafão de “rosmaninho” e oferece-lo ao porteiro da urgência para um melhor e mais rápido atendimento! Espantei-me novamente com um cartaz na fachada da cooperativa oleícola que dizia o seguinte: “A DIRECÇÃO QUER QUE OS SEUS ASSOCIADOS ARRANQUEM AS OLIVEIRAS E FAÇAM LENHA QUE O INVERNO VAI SER RIGOROSO”. Já completamente desorientado e munido do “rosmaninho” para untar as mão do porteiro do hospital de Flávia, onde depois de analisado, inquirido, observado e radiografado, fui ao fim de oito horas transferido para o Porto em ambulância paga pelo estado. O bombeiro fervoroso adepto do FCP fez um desvio pelo dragão onde adquiriu uns bilhetes para vender na candonga, que a vida não está fácil. Foi então que deitado na maca, por uma nesga do vidro da ambulância, vi um grande cartaz vermelho pendurado na entrada principal do estádio do dragão onde estava escrito em letras brancas garrafais: “A DIRECÇÃO DO FCP QUER O ESTÁDIO DO DRAGÃO CHEIO DE BENFIQUISTAS”.
Quando contei toda esta história, os meus medos, a minha estranheza, os cartazes sem nexo, ao médico que me atendeu no Santo António, observei-lhe um sorriso tranquilizador na face, e enquanto me auscultava foi-me dizendo com uma expressão matreira de quem está senhor da situação: - este ano o carnaval começou mais cedo!!
A confraria fechou o hospital? Está à vista de todos!! Vai voltar a abrir? Eles dizem que sim e ainda com melhores serviços, pois em vez de médicos especialistas vão ser os autoproclamados sábios a trabalhar no hospital, tendo já sido distribuídas as respectivas valências a saber:
O Marquês de Alfarelos filho de El Rei Dom João VI, vai ficar com a valência de otorrino pois aquilo é só garganta…
O Visconde da Foz Dom Pimentel da Botica ficará com as análise clínicas e organolépticas por motivos que são óbvios…
Ao Dom Gualter de Los Jamones Conde de La Bodega, foi-lhe atribuída a consulta de oftalmologia pois não há melhor olho para o negócio…
O Marquês de Viagreta Dom Geninho Três Ais, com o cargo vitalício de confrade-mor, fica com a consulta de ginecologia e doenças ano-rectais, pois como dizia S. Tomás de Aquino, “ a experiencia é madre de todas as cousas”…
Ao Conde da Betoneira Dom António Sulfuroso, foi-lhe distribuída a valência de ortopedia por ser entendido em cimentos…
O escriba-mor do reino Dom Pires Zás Trás fica responsável pela terapia da fala, porque a escrita já não tem remédio…
Ao Barão de São Pedrinho Dom Luís Maleitas, foi-lhe distribuída a responsabilidade da farmácia, pois o Visconde da Foz Dom Pimentel da Botica já velho e cansado deixou-se ultrapassar…
O Barão do Cossacos e Visconde de Tirapicos Dom Pernache da Lousa, fica com as consultas de psicologia, pois são difíceis, demorados e misteriosos os caminhos que levam ao poder…
Por último ao adorador da Deusa de Khali e Alcaide de Sem Fins, foi-lhe atribuída a contabilidade e o aprovisionamento, enquanto não se arranja acordo com o ministério para a especialidade que ele tanto almeja e que estará mais de acordo com as competências que toda a gente lhe reconhece.




PS: Não é o estilo mais ou menos brejeiro, ou mais ou menos jocoso com que escrevo e a que os meus leitores se habituaram, que retira da situação dramática em que se encontram os trabalhadores do hospital e as suas famílias. Para os doentes que se viram privados de uma unidade de saúde e para todos os trabalhadores sem excepção que a souberam dignificar, toda a minha solidariedade.

Até Breve
Plublicado no Jornal Trinuna Valpacense em 05 Março de 2011