segunda-feira, 28 de novembro de 2011

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Soube há pouco tempo que aquando da visita do Barão de Boliqueime Dom Regressado Silva ao reino de Valdecacos para inaugurar o agrupamento escolar, estaria prevista uma manifestação com cartazes empunhados por alguns ex-trabalhadores do hospital, mostrando o seu descontentamento pelo encerramento do mesmo, com todas as consequências negativas que daí vieram para as populações e também pela perda do posto de trabalho numa época de crise em que o desemprego aumenta assustadoramente.
Soube também que os cartazes acabaram por não aparecer por pressões várias do Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum, para quem pelos vistos, o direito à indignação e à manifestação do desagrado pela perda de um equipamento fundamental para o povo como era o hospital é menos importante que a imagem idílica, prosaica e cordata das criancinhas a bater palmas, num esquema ensaiado por professores e políticos que me fez lembrar as visitas do finado Almirante Américo Tomás, não faltando no fim da cerimónia um opíparo almoço para as entidades, pois ao contrario do sol, a crise quando nasce não é para todos.
Não houve um só ano desde a revolução de Abril, em que a dívida do condado Portucalense e de todos os reinos que o compõem não tivesse aumentado, encontrando-nos neste momento a braços com a maior crise de sempre. Os políticos, todos eles, gastaram o que tinham e o que não tinham, e quantos mais anos passaram no poder mais gastaram. Tanto no poder central como no poder local.
Quem não conhece obras faraónicas, obras desnecessárias, subsídios mal atribuídos, subsídios não aplicados na finalidade com que foram obtidos, ordenados chorudos, senhas de presença principescamente pagas por empresas públicas, viagens sumptuosas, carros topo de gama, assessorias mal justificadas e pagas a peso de ouro, etc. etc.  etc.
Pois agora o discurso politicamente correcto é o discurso da poupança e o nosso chefe do governo Dom Xico Mirandum, numa de bom aluno perante o afamado professor de finanças, lá foi dizendo que deixando as aldeias do reino às escuras durante a noite já conseguiu poupar 11 milhões de euros.
Essa quantia, daria para construir e equipar em excelente hospital que não temos.
Daria para construir um complexo de piscinas com parque de campismo e um mini Zoológico na zona da Freixeda, sonho antigo das gentes de Valdecacos, e que não temos.
Daria para apoiar a criação de empresas de transformação na indústria agro-alimentar (castanha, figo, frutos secos, azeitonas, compotas, etc.), criando emprego e fixando pessoas, mas que também não temos.
Daria para adquirir, reconstruir e conservar o pouco património histórico e arquitectónico do reino que se encontra ao abandono…
Daria para apoiar a criação de explorações familiares de porco bísaro, certificando o fumeiro como se faz no vizinho reino de Vinhais, criando emprego e fixando pessoas nas suas aldeias, fumeiro que entra na elaboração do folar que apesar de tantas feiras ainda não saiu da cepa torta.
Daria para construir de raiz uma escola profissional com cursos credíveis e virados para o mercado de trabalho, que também não temos…
Daria para construir e equipar o pólo universitário do Instituto Politécnico de Bragança, promessa não cumprida de uma campanha eleitoral, com protocolo assinado e tudo, mas que não temos…
Então para que serviram os 11 milhões de poupança? Estarão na Caixa a render? Ou serviram apenas politicas eleitoralistas que mantiveram no poder a mesma força política nos últimos 30 anos?
As cortes do condado Portucalense elegeram para sua presidente a Baronesa do Terreiro Dona Expropriação Esteves, nada e criada no reino de Valdecacos, jurista com carreira invejável, e que já tinha sido a primeira mulher a exercer funções no Tribunal Constitucional. Tendo já tido um voto de louvor e congratulação aprovado por unanimidade nas cortes de Valdecacos, vai agora presidir à inauguração da Biblioteca do reino. O Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum que dela disse o que o Maomé não disse do toucinho, por causa dos terrenos da zona industrial, em que o governo de Valdecacos foi condenado a pagar um balúrdio, terá agora que dizer o contrário, o que para um político há 30 anos no poder não é nada do outro mundo!!
O Marquês dos Colmeais, Dom Filipe Pratumba, personagem destas crónicas, há alguns anos arredado da vida política, deixou-nos prematuramente, não passando já de saudade, as animadas tertúlias no café Purgatório, com o Barão do Tanque Novo Dom Jota Xitunda, o Marquês de Águas Frias Dom Tino Flávia, o Duque de Manteigas Dom Joselito de La Estrela e Benfica e o Morgado de S. Francisco Dom Catalone El Bone. As suas “bocas” propositadamente destabilizadoras conhecidas como “pratumbadas”, levavam os outros intervenientes a um estado de quase apoplexia, deixando o Marquês de Tinoni Dom Bino Flavia de olhos arregalados atrás do balcão, quando se levantava, risonho a caminho dos Colmeais de melena ao vento, depois de ter provocado a maior das confusões. Imagino-o agora, na restinga do Lobito sentindo a brisa do mar e olhando o por do sol ímpar daquele rincão africano que ele tanto amava.

Até Breve
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 04 de Novembro de 2011