sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE


O Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum anunciou com pompa e circunstância que vai abandonar o poder até ao final do ano, ou seja, não fica até ao último minuto da última hora do último dia, que seria algures no último trimestre do próximo ano.
Esta situação que deixou perplexos alguns comentadores políticos e surpreendeu alguns elementos da oposição, tem a meu ver uma primeira e principal justificação, de que falarei mais adiante.
Foram no entanto vinte e sete anos, ou seja, nove mil oitocentos e sessenta e três dias, duzentas e trinta e seis mil quinhentas e vinte horas, catorze milhões cento e noventa e um mil e duzentos minutos de poder raras vezes partilhado, exercido com rédea curta, sempre obediente às indicações do partido, sem nunca ter tido uma visão estratégica para o reino que foi perdendo a importância regional que já teve em relação aos vizinhos reinos de Minrandum e da Flávia.
Vinte anos antes de no Condado Portucalense se falar em partidocracia, ou seja, uma forma de estado em que as oligarquias partidárias assumem o controlo efetivo do poder, já eu na primeira crónica escrita no extinto Jornal de Valdecacos, cujo proprietário e diretor era o Marquês das Padanas Dom Godofredo Barroso, alertava para o poder desmesurado e discricionário de sua majestade laranjinha no reino de Valdecacos.
Pois ao fim deste quase quarenta anos de poder laranja no reino de Valdecacos, 70% dos quais exercidos por Dom Xico Mirandum, em que houve mais que tempo para preparar uma passagem de poder que nos permitisse olhar o futuro com alguma esperança, isto é, uma candidatura jovem, vinda da sociedade civil, alguém com provas dadas no ramo empresarial, com ideias abertas, com bom relacionamento e bons contactos no Condado Portucalense e no estrangeiro, ou um profissional liberal credível, com provas dadas no seu ramo de atividade, com curso tirado em universidade do estado, sem cadeiras feitas ao domingo ou por equivalência, alguém que não precisasse da politica para sobreviver, alguém que nos soubesse defender e reivindicasse no Terreiro do Paço aquilo que é nosso por direito, alguém com um plano de desenvolvimento bem estruturado, alguém com vontade de servir o povo e não de fazer carreira politica. Podia ou não o Dom Xico Mirandum ter-se batido por uma solução destas? Então por que é que o não fez?
Porque se o fizesse, ao fim de seis meses os seus quase vinte e oito anos de governação seriam completamente ofuscados e o povo aperceber-se-ia rapidamente da tremenda asneira que foi mantê-lo no poder durante tanto tempo.
Aí o Barão de ferreiros começou a pensar numa solução em que as coisas só pudessem ir para pior, pois seria a única maneira do povo vir a sentir algumas saudades…
E não precisou de pensar muito, conhecendo ele a peça melhor que ninguém, tirou da cartola o Marquês de Calavinhos que já se encontra no governo há doze anos e se prepara para chefiá-lo mais doze.
Alguém lhe conheceu algum elemento curricular de relevo, alguma ideia, algum programa nos anos em que esteve no governo de Dom Xico Mirandum? Que se saiba os doze anos serviram apenas para aliciar e inscrever militantes no partido de sua majestade laranjinha.
Será este o castigo para quem foi presidente da assembleia geral da confraria que levou ao encerramento do Hospital de Valdecacos?
Se a situação não fosse trágica, até daria vontade de rir, a mim quando me contaram olhei em redor a ver se descobria alguma câmara de filmar da televisão, pois pensei que era o programa dos apanhados mas infelizmente não, parece que é mesmo verdade!!
Maquiavélico! È o adjetivo adequado para a maneira encontrada por Dom Xico Mirandum se tornar desejado depois de se ter ido embora. Já o imagino a rir-se para os seus botões e a pensar “eu vou-me embora mas ainda ides chorar por mim”.
Então e os rosas o que é que fazem no meio de esta tragicomédia? E os centristas? E os laranjinhas? O que pensa a Condessa da Fradizela Dona Suprema Bonçalo? E o Visconde de Puralina Dom Tião Cidade das Neves? E o histórico alcaide de Valdecacos Dom Lapalino Del Sardon? E o seu filho Dom Maugénio Del Sardon? E o Marquês de Piscaneto Dom Zé Generoso? E o Duque de Manteigas Dom Joselito de La Estrela e Benfica? E o Barão do Tanque Mansinho Dom Zé Carioca? E o Presidente da Fundação Oriente Dom Staneloy Ho? O que é que toda esta gente tem a dizer sobre esta solução que tem um significado de “evolução na continuidade” da passagem de testemunho do Salazar para Marcelo Caetano. Será que também teremos que esperar quatro ou cinco anos para termos o nosso 25 de Abril?
Consta-se que o Marquês do Pereiro Dom Alfonso de La Niña tem vindo a ser contactado e pressionado para encabeçar uma candidatura abrangente, que defronte o poder instituído. A ver vamos!
 

PS: “O preço a pagar pela tua não participação na política, é seres governado por quem é inferior”. (Platão 428-347 A.C.). 

Até Breve
Publicado no jornal Tribuna Valpacense em 07 de Dezembro de 2012

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE


Esta é a crónica de uma morte anunciada. A notícia chegou dura, fria, breve e seca. O Marquês do Correio Velho Dom Rubio Soutinho faleceu vítima de doença prolongada.
Personagem há uns anos arredado destas crónicas, foi um destacado natural do reino de Valdecacos que correu mundo, vencendo inúmeras batalhas contra um destino que por vezes lhe foi adverso, mostrando sempre uma vontade e uma perspicácia fora do comum.
De Angola à Africa do Sul, do Brasil a Espanha, dos reinos da Maia a Valdecacos, a sua vida daria um filme em que se conjugariam todos os géneros cinematográficos, desde a aventura à guerra, do ódio à paixão, do drama à comédia.
Foi ele o pilar em que assentou a geminação dos reinos da Maia e Valdecacos, quando nos tempos áureos do cavaquismo, se movimentava como peixe na água nos círculos do poder.
Amigo dos amigos (poucos), implacável com os inimigos (alguns), amigo dos prazeres da vida e da mesa, ficaram célebres algumas festas de aniversário em que chegou a juntar algumas centenas de pessoas em lautos almoços e jantares.
Crítico da “abrilada” (25 de Abril), fazia questão de se ausentar todos os anos do condado Portucalense no dia 24 regressando apenas a 26 de Abril. Nas curtas estadias que ao longo dos anos passou no reino de Valdecacos, costumava juntar um grupo de amigos da velha guarda em opíparos lanches que se prolongavam por tardes inteiras e por vezes continuavam noite fora, a que chamava reuniões do “Conselho da Revolução” numa paródia conseguida ao dito cujo, onde na altura pontificava o Rosa Coutinho conhecido como o “Almirante Vermelho”, a quem o Marquês do Correio Velho Dom Rubio acusava de ter entregue o reino de Angola aos comunistas.
Eram membros efetivos do Conselho da Revolução de Valdecacos o Dom Rubio, o Dom Armandinho, o Dom Maximiano, o Dom Amândio e o Dom César, seguindo-se como suplentes o Dom Abreu e o Dom Aguiar, e como observadores o Marquês de La Frontera Dom Corleone de La Mancha e o Marquês do Pereiro Dom Alfonso de La Niña. Havia depois alguns personagens que de acordo com as circunstâncias e os humores do Dom Rubio eram esporadicamente convidados para algumas reuniões do Conselho.
A todos o Dom César batizava, e não foi fácil conseguir esta informação, mas deixo-vos algumas das nomeadas que ele utilizava e a vossa imaginação que as correlacione com as personagens respetivas.
O Caudilho, o Chalato, o Vilaranda, o Lafusco, o Guiças, o Sineiro, o Carqueja, o Pelinhas, etc, etc.
Já não resta nenhum dos membros efetivos do Conselho da Revolução de Valdecacos, é mais um virar de página na historia deste reino, que mais de 20 anos depois da geminação com o reino da Maia, tem visto outro gémeo a crescer em população e em desenvolvimento, enquanto nós vamos definhando e empobrecendo alegremente, sem que se vislumbre uma alternativa às politiquices que nos levaram a esta situação, o que me lava a pensar que o reino de Valdecacos mais que um Conselho da Revolução, precisa de uma revolução no concelho.
Ao fim de 42 anos no reino de Valdecacos o Arcipreste Dom Papalves rumou ao reino de Perafita, para um merecido descanso. Algumas atitudes polémicas e o feitio barrosão causaram dissabores a alguns paroquianos e ao próprio. Num percurso tão longo no tempo tem forçosamente que haver altos e baixos, e tal como Salazar, mentor de alguma igreja antiquada e retrograda, quando se permanece em cargos de chefia ao longo de décadas, normalmente as entradas são de leão e as saídas nem por isso!
Seja como for, o largo da igreja do reino de Valdecacos não voltará a ser o mesmo sem o Arcipestre Dom Papalves de um lado e o Marquês do Correio Velho Dom Rubio Soutinho do outro.
Que o Dom Papalves encontre finalmente a paz de espirito que as beatas e os beatos aqui nunca lhe permitiram ter, e que o Dom Rubio Soutinho reúna rapidamente o Conselho da Revolução lá no céu, pois o Dom Armindo dos Possacos arranjou lá um cantinho aprazível onde todos já se encontram à espera, para uma tarde bem passada.

 

Até Breve
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 10 de Novembro de 2012

sábado, 3 de novembro de 2012

CRONICAS DO REINO IV SÉRIE

Aí vamos nós, a passos largos, a caminho de mais um inverno do nosso descontentamento. O Condado Portucalense, exausto e exangue com tanta austeridade imposta pela TROIKA e executada e agravada pelo governo do Marquês de Vila Real Dom Passos Guedelho, está praticamente moribundo.
Do Minho aos Algarves, o povo saiu à rua, protestando contra as péssimas condições de vida a que se encontra sujeito, em manifestações com uma participação e grandiosidade que já não eram vistas desde o 1º de Maio de 1974.
Mas se o Condado Portucalense está moribundo devido à crise e às exageradas medidas de austeridade que estão a matar a economia, o reino de Valdecacos já morreu há mais de uma dúzia de anos, devido à falta de uma estratégia de desenvolvimento e às políticas erradas de quem nos tem (des) governado.
Se a grande maioria das pessoas em idade produtiva e reprodutiva já abandonaram o reino, por aqui não encontrarem condições de trabalho, emprego e sobrevivência, ficaram apenas uns milhares de zombies que deambulam de um lado para o outro, entre as sedes do governo e da confraria, em busca de um subsídio ou de uma merenda gratuita.
“Com festas e bolos se enganam os tolos”. Aí está uma realidade sempre presente nos últimos trinta anos no reino de Valdecacos. Não houve uma única inauguração desde o mais humilde chafariz até às escolas mais importantes, passando pelas sedes de cada uma das trinta e uma alcaiderias do reino, por estradas e calcetas, por pavilhões desportivos e multiusos, por lares de terceira idade e centros de dia, piscinas quentes e frias, quarteis da polícia e da G.N.R, universidades, bibliotecas, feiras e romarias, tudo isto serviu para os políticos se exibirem e mostrarem aos “tolos” como se preocupam com eles.
Assim fomos todos de inauguração em inauguração, de festa em festa, até ao descalabro total.
As festas assim como os centros comerciais, são no sec.XXI o bodo e o palácio dos pobres. Há-de chegar o dia em que os “tolos” vão ganhar juízo e perceberem o quanto foram enganados e abusados ao longo dos tempos. Os milhares de jovens desempregados, que esperança podem ter num reino empenhado para os próximos trinta anos, pelos gastos excessivos e descontrolados de meia dúzia de pessoas apenas interessadas no seu conforto pessoal e na sua família política?
Quando o governo do Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum se envolveu descaradamente e utilizando métodos pouco ortodoxos e de caciquismo primário no apoio a uma lista para a direção do agrupamento escolar de Valdecacos, sabia ou não sabia que alguns membros dessa lista estavam a ser alvo de um inquérito, por ações praticadas em conselhos diretivos anteriores?
Corre à boca cheia que o resultado da inspeção não propõe nenhum louvor aos visados antes pelo contrário! E agora? Qual a justificação? E os alunos? Alguém pensou neles?
O presidente das cortes Dom Juanito de La Bisabuela, que diz a toda a gente que a Baronesa do Terreiro Dona Expropriação Esteves nunca fez nada pelo reino de Valdecacos, acha que conseguirá fazer alguma coisa na enrascada em que se meteu o irmão de Dom Caím Conde do Cutelo Melhor?
Teremos foguetes novamente? É claro que sim, pois este reino é uma festa e com “festas e bolos se enganam os tolos”.

 

PS: “Entre o governo que faz o mal e o povo que o consente há uma cumplicidade vergonhosa”, Vítor Hugo.

Até Breve

Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 12 de Outubro de 2012

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE


Aqui há tempos, tive necessidade de me deslocar à farmácia, para aviar uma receita que me passaram nas urgências de reino de Mirandum, que juntamente com as urgências do reino da Flávia, atendem os 15 000 tristes habitantes do reino de Valdecacos, que há mais de um ano foram espoliados do seu hospital pelo Ex confrade mor Dom Geninho Três Ais, bem acolitado pelo Visconde de Alfarelos e por outros que todos sabemos quem são e que por aí continuam despudoradamente como se nada tivesse acontecido. Consta-se até que ao contrário da grande maioria dos funcionários do hospital que perderem o seu posto de trabalho e atravessam momentos de grandes dificuldades, o Marquês de Viagreta foi visto no reino dos Algarves, a disfrutar da amenidade do clima e da temperatura das águas, lançando olhares libidinosos aos corpos morenos e bem torneados das jovens turistas, que tal como a garota de Ipanema imortalizada há 50 anos por Tom Jobim e Vinícius de Moraes, passam num doce balanço a caminho do mar.
Mas mudemos de assunto, pois como diz o povo na sua sabedoria sedimentada ao longo de séculos “não merece a pena gastar mais cera com tão ruins defuntos”.
Pois como ia dizendo e ao contrário de muitos que são atendidos nas urgências de reinos vizinhos e acabam por adquirir lá os medicamentos, prejudicando o já depauperado comercio do reino de Valdecacos, recorri à farmácia que estava de serviço na minha terra pois era domingo. Encostei-me um pouco ao balcão porque tinha duas pessoas à minha frente, uma das quais um jovem emigrante que pediu uma caixa de camisinhas sem mangas, pois em Agosto o calor aperta, os arraiais são muitos e as tentações ainda mais e nestas circunstancias homem prevenido vale por dois.
Atrás do balcão, o Barão de Alvalade Dom Xico Xicão, discípulo dileto do finado Doutor Lixivia, enquanto procurava o artigo, virou-se para o interior da farmácia e perguntou:
- Então já soube do evento social que houve ontem no café Russo nas Lages?
Aparecendo à porta, vindo do interior da farmácia o Visconde de Setúbal Dom Godofredo Miau respondeu com um não que mais parecia um grunhido.
O Dom Xico Xicão lá explicou que o estado-maior laranja esteve reunido à volta de um lauto almoço oferecido pelo Marquês de Santa Maria Dom Assediado, com pretexto de festejar os anos, e que por estranho que pareça já é a segunda vez que acontece este ano, mas que no fundo se trataria de um encontro preparatório para o lançamento de uma candidatura abrangente ao governo de Valdecacos.
Ainda não tive oportunidade de me encontrar com nenhum dos comensais presentes, nem sequer confirmar a identidade dos mesmos, mas quem já o deve saber e não estará nada contente é o Marquês de Calavinhos Dom Milkes Varredor que sabe com quem lida e tem medo que lhe façam a cama.
Uma noite destas passou-se esta cena que me contaram e que é de partir o coco a rir! Subiam a avenida da Sª. da Saúde em amena cavaqueira o Morgado de São Francisco Dom Catalone El Bone, com o Marquês do Pereiro Dom Alfonso de La Niña, mais o Marquês de La Frontera Dom Corleone de La Mancha e o agente da alta autoridade contra a corrupção e inspetor mor do reino Dom Torelo Luís, Barão do Largo da Palha. Este ultimo falando da política e dos políticos em geral, dizia que não dormiria descansado enquanto não visse alguns atras das grades. Ora nesse preciso momento, descendo de sua casa em direção à avenida passeando distraidamente o caniche, o presidente das cortes Dom Juanito de La Bisabuela, ouvindo falar Dom Torelo e vendo as outras três personagens, mudou de repente de direção, deu um puxão na trela do caniche, que o desgraçado andou uma dúzia de metros pelo ar e aterrou no passeio do lado oposto, acompanhando aflito o passo estugado do dono que se afastava rapidamente do local, não fosse o diabo tece-las… 

Até Breve
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 31de Agosto de 2012

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Este ano fui a Valverde às festas de Nossa Srª do Carmo. Já há muito tempo que lá não ia, pelo que aproveitei para dar uma volta pela aldeia e observar as transformações lá efetuadas nos últimos anos. Sendo uma das duas aldeias anexas à capital do reino, Valverde tem beneficiado pelo facto dos dirigentes de três instituições se digladiarem na obtenção de apoios e votos, facto esse que tem levado à realização de obras por vezes necessárias, outras vezes nem tanto. O governo, a alcaideria e a confraria decidiram apostar em Valverde.
Pois como eu estava dizendo, e contrariando a crise instalada, a festa esteve animada, prolongando-se por sábado, domingo e segunda-feira, com missa procissão e dois ou três arraiais não faltando a banda de Valdecacos numa competente arruada.
Quando acompanhava a procissão, vendo as ruas e calçadas limpas e arranjadas ao contrário do que é habitual, ouvi uma velhota que caminhava com dificuldade amparada numa bengala, comentar com o parceiro do lado que tinha sido o Bítaro a dar dinheiro para limpar e arranjar as ruas. Na hora da missa e perante os bonitos arranjos florais, uma beata com um lenço de renda negro a cobrir-lhe a cabeça, comentava com outra que tinha sido o Bítaro a dar dinheiro para as flores.
À noite no arraial, enquanto duas dúzias de rapazes e raparigas rodopiavam no largo da capela, ao som duma música brejeira do Quim Barreiros, tocada por um desses conjuntos que animam as festas populares, um rapaz com um corte de cabelo futurista e uma camisola de alças, com etiquetam dos armazéns Printemps de Paris que deixavam os ombros fortes e morenos à mostra, de garrafa de cerveja na mão e cigarro no canto da boca, dizia para outro que tinha sido o Bítaro a dar o dinheiro para o conjunto.
Por volta da meia-noite o céu iluminou-se com as girandolas e as balonas, e o chão estremeceu com o ribombar dos morteiros. Era o fogo-de-artifício imprescindível num arraial tipicamente transmontano. As poucas crianças que por ali andavam correram procurando refúgio e aconchego junto das mães, e olhando para o céu com os olhos ao mesmo tempo assustados e curiosos, deixaram refletir neles uma miríade de estrelas de todas as cores. Foi então que uma das mães comentou com outra que tinha sido o Bítaro a dar dinheiro para o fogo-de-artifício.
Comecei a pensar que o Bítaro fosse um desses canadianos, a maneira como são conhecidos pelos seus conterrâneos os que fizeram pela vida e foram bem-sucedidos no longínquo reino do Canadá.
Procurei satisfazer a minha curiosidade sobre tão ilustre e rica personagem, quando para meu grande espanto me disseram que o dito Bítaro é o Visconde de Valverde Dom Vitinho Corócócó.
Pensei cá com os meus botões, será que o Dom Vitinho Corócócó, se conseguiu libertar do estigma de surra com que são classificados todos os que nascem em terras de Valverde, e investiu parte das massas que recebe do governo para despesas de representação na festa da sua terra, ou será que é dinheiro da TROIKA que saiu pela porta dos subsídios?
Esta é a única aldeia do reino em que o Marquês de Calavinhos Dom Milkes Varredor se sente com peixe fora de água. Ele sabe que aquele território tem dono, é do Bítaro, aliás do Visconde de Valverde Dom Vitinho Corócócó, que nesta altura do campeonato ainda não poderá ser classificado como uma carta fora do baralho, na sucessão ao Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum.
 

PS: É altura de Dom Xico Mirandum terminar o curso de direito na Lusófona, pedindo equivalências às cadeiras que lhe faltam, pois o currículo dele é em meu entender superior ao do Relvas. Ficará assim com dois canudos, aumentando seriamente as hipóteses de vir a ser convidado para algum cargo governamental.                                                      

 
Até Breve!
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 04 de Agosto de 2012
 

domingo, 5 de agosto de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Ele está em todas. Agora que nos encontramos em plena quadra festiva dos santos populares, lembra-me esse grande santo casamenteiro de seu nome Fernando Bulhões mas que todos conhecemos como Stº. António de Lisboa ou de Pádua conforme a nossa nacionalidade, único santo da igreja a quem Deus concedeu o dom da ubiquidade, ou seja o poder de estar em mais que um local ao mesmo tempo.
Pois o nosso personagem, até parece que tem o mesmo dom dada a sua assídua presença em toda a parte. Se há um batizado em Lebução e outro na Veiga lá o vemos a tirar uma fotografia e dar um beijo ao neófito num lado, e a fotografar-se com os avós no outro. Se há um casamento em São João e outro em Rio Torto lá o vemos num lado e noutro a cumprimentar noivos e convidados, com um sorriso de orelha a orelha.
Se há festa com procissão é certo encontra-lo atrás do andor principal, com o ar circunspecto e fervoroso de que o povo tanto gosta.
Se há arraial mesmo na mais recôndita das aldeias do reino, aí o temo a confraternizar com as pessoas, a comentar o fogo-de-artifício, a fazer uma oferta simbólica ao padroeiro ou padroeira.
Se há um evento desportivo lá está ele a distribuir sorrisos e medalhas, falando nos benefícios da actividade física e no seu amor pela modalidade seja ela qual for.
Se há apresentação de um livro no centro cultural, lá o temos a tecer elogios ao escritor e a arengar sobre literatura portuguesa, da importância do conhecimento dos clássicos da sua preferência pelos românticos, do estilo dos modernos e contemporâneos, omitindo propositadamente o nosso único prémio Nobel por motivos de ordem ideológica.
Se pelo contrário houver uma exposição de artesanato lá está ele a falar da importância do mesmo, e de como irá incentivar e apoiar os artesãos, criando um fundo especialmente destinado para o efeito.
Também já o vimos a apresentar escultores e pintores, discorrendo sobre a importância das artes plásticas na formação de um individuo e da mais-valia estética dos quadros pendurados nas paredes de um futuro museu que ele irá mandar construir, aproveitando a sinergia dos nossos emigrantes para fazer intercâmbios culturais e exposições concertadas com os maiores museus do mundo, desde o MoMa de Nova Iorque, ao Guggenheim de Bilbao passando pelo museu do Prado pelo Louvre, o Hermitage, todos eles farão intercambio com o futuro museu de Valdecacos, que será provavelmente instalado num dos barracões existentes nas traseiras da Casa do Vinho (que por sinal cheira a azeite rançoso), que evidentemente terão obras de remodelação a cargo de um dos empreiteiros do regime.
Se uma das inúmeras associações ditas culturais e para o desenvolvimento, que proliferam por todas as alcaiderias do reino e que são um sorvedouro de dinheiros públicos e uma forma de encapotadamente financiar actividades do partido laranja necessita de algum subsídio, e o Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum oferece 500, o nosso personagem vai por trás e diz que se fosse ele a mandar dava 1000.
Uma das actividades que lhe dá mais trabalho são os funerais. Com os habitantes do reino completamente envelhecidos e os militantes a morrerem que nem tordos, é vê-lo, afivelando uma mascara de gato-pingado, a dar os sentidos pêsames às viúvas filhos e netos, prometendo melhorias nas calçadas e nos cemitérios para tornar mais fácil a ultima viagem e mais confortável a ultima morada. Cumprindo a cartilha do verdadeiro autarca de Valdecacos os eleitores são acompanhados do nascimento até à morte e nos mais importantes eventos da vida.
A esta altura do campeonato, não do europeu que ainda decorre mas das autárquicas, já toda a gente identificou o Marquês de Calavinhos Dom Milkes Varredor com o personagem que está na berlinda. Não é segredo para ninguém que ele quer suceder ao Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum, e faz e fará tudo para concretizar esse desejo, chegando a perder as estribeiras com quem supostamente lhe possa fazer sombra.
Aqui há tempos num jantar de amigos em que se encontravam presentes vários elementos que há uns anos atrás militaram nas jotas laranja e rosa do reino de Valdecacos, e dada a situação de descalabro a que chegou o reino, pensaram em apoiar algum dos jovens persentes para encabeçar uma alternativa credível, vinda da sociedade civil, uma personalidade com provas dadas fora do reino, que já estivesse estado à frente de empresas ou instituições com responsabilidades acrescidas com curso credível tirado em universidade estatal, com ideias novas, sem vícios ou ligações com o polvo instalado. Segundo apurei, um dos intervenientes nesse jantar foi o Marquês de Tábuas Dom Claudino Apavorado também conhecido pelo Pequeno Helvético. Pois quando o Marquês de Calavinhos Dom Milkes soube disso convocou o Pequeno Helvético à sede do governo e de traidor para cima chamou-lhe tudo, culpando também o Barão de Ferreiros pelo acontecimento, chegando a dizer ao Dom Xico Mirandum num tom de voz completamente alterado que o melhor que tinha a fazer era arrumar as botas e ir embora pois já não mandava nada.
Guardado está o bocado para quem o há-de comer”, diz o povo. 



PS: Quando vires um homem bom imita-o; quando vires um homem mau olha para ti mesmo.(Confúcio)


Até Breve

Publicado no Jornal "Tribuna Valpacense" em 07 de Julho de 2012

quinta-feira, 12 de julho de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Aqui há tempos, encontrando-me no Porto com um grupo de pessoas do norte entre as quais algumas do nosso reino, queixei-me do autêntico marasmo em que caiu a capital de Valdecacos. Comércios vazios, lojas encerradas, vivendas fechadas, apartamentos à venda, cafés com um ou dois gatos-pingados, ruas desertas e se por acaso nos cruzamos com alguém, as pessoas carregam um semblante triste e acabrunhado de quem já perdeu todas a ilusões.
Mas pior do que ter perdido as ilusões, é as pessoas terem perdido a capacidade de se revoltar contra as circunstâncias que transformaram um dos melhores reinos de Trás-os-Montes e a sua capital, num arremedo de cidade, rodeada por lugarejos que já foram Aldeias com A grande, mas que agora não passam de lares de terceira idade a céu aberto.
O reino de Valdecacos caminha a passos largos para um abismo há muito anunciado, e os responsáveis pelo governo local, continuam a assobiar para o lado, a embolsar os ordenados, as ajudas de custo e as senhas de presença, como se nada fosse com eles. Apenas estão preocupados em assegurar para filhos amigos e enteados, um lugar à mesa do orçamento, que eles vão ter de abandonar por imposição da lei.
A fundação Francisco Manuel dos Santos, ligada ao grupo Jerónimo Martins, criou a maior base de dados sobre o condado Portucalense e todos os seus reinos. Chama-se PORDATA e pode ser consultada na internet em pordata.pt.
Ali podemos consultar a evolução do país em vários domínios ao longo dos últimos 20 anos, desde taxas de natalidade e mortalidade, desemprego, desenvolvimento, emprego, ambiente, qualidade de vida, poder de compra, actividades culturais, demografia, processos judiciais, estabelecimentos de educação e de saúde, etc…etc…etc.
Todos os reinos do condado Portucalense podem ser comparados uns com os outros e podereis constatar que o lugar do reino de Valdecacos nos vários rankings, anda sempre pelos fundos das tabelas, contrariando a visão dos responsáveis políticos locais, que em discurso atrás de discurso têm convencido o povo ao longo dos anos a dar-lhes o voto, num dos maiores e repetidos embustes de que tenho conhecimento.
Nessa reunião no Porto, um dos presentes que assistia à conversa, figura grada do partido laranja a nível nacional, lá foi argumentando que Valdecacos tinha tido muito azar com o facto de circunstancialmente os governantes locais sem excepção terem sido muito pouco competentes ao longo de muitos anos, aliado ao facto de termos dois polos de atracção muito mais fortes a norte e a sul do reino, que são os reinos de Mirandum e da Flávia, e tudo isto levou à situação de catástrofe em que nos encontramos. Não deixou também de me referir, que muitas vezes o chefe faz a diferença pouco importando a fraqueza ou fortaleza do reino e do povo, dando-me como exemplo dentro do seu próprio partido e também na nossa região, do caso de reino do Boticário e do seu chefe do governo Dom Fernando Campónio, que conseguiu para o seu pequeno reino aquilo que outros nunca conseguiram, fosse qual fosse a cor dominante no Terreiro do Paço.
É por estas e por outras que o Dom Fernando Campónio como muitos outros que agora vão ter de abandonar o poder devido à limitação de mandatos, já se consta que provavelmente será convidado a encabeçar uma lista no reino da Flávia. Também estou convencido que aqui em Valdecacos faria um bom lugar, sendo a meu ver muito mais capaz que qualquer dos candidatos que até agora se perfilam, tendo até a vantagem de poder vir a habitar no palacete que o seu grande amigo e presidente da Fundação Oriente Dom Staneloy Ho está a reconstruir na capital do reino.
Então o nosso Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum ninguém o quer? Estou convencido que os habitantes de Valdecacos o transferem de bom grado sem querer nada pelo passe e ainda dão meia dúzia de folares de bónus a quem o levar.
Ou será que o Marquês de Alijó Dom Pedro Morronel lhe vai retribuir o favor e o chama para assessor?



PS: É raro dia em que a torre da igreja da capital do reino não toca os sinais a defuntos. Muito boa gente tem partido deste reino envelhecido e triste. Soube extemporaneamente da morte da mãe dum personagem destas crónicas que é o barão do Tanque Mansinho Dom Zé Carioca. Verdadeira mulher do povo, corajosa, simples e respeitadora, apanágio das gentes antigas de Valdecacos, gentes a quem podia faltar tudo, mas nunca faltava a dignidade. Exemplos infelizmente hoje raros de se encontrar. Ao Dom Zé Carioca os meus respeitosos sentimentos.

Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 11 de Maio de 2012

quinta-feira, 10 de maio de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Quando na última crónica escrevi que no reino de Valdecacos da maneira como as coisas estão encaminhadas, os jovens têm que ir para fora ganhar a vida, pois quando muito apenas haverá futuro para meia dúzia deles com cartão laranja, esqueci-me de caracterizar esses celebres cartões que no reino de Valdecacos são na maioria das vezes a chave mestra que dá acesso aos subsídios, aos favores, ao emprego, e por vezes ao poder.
Há pois vários tipos de cartões laranja, mas nem todos levam a determinados lugares e alguns primam mesmo pela exclusividade de se contarem pelos dedos, as pessoas que deles são titulares.
O cartão laranja-platina, o mais exclusivo de todos dá entrada nas altas esferas do poder, não só no reino de Valdecacos mas também em todo o Condado Portucalense, e mesmo na Europa e no mundo. Dá acesso a ordenados fabulosos, gordas contas bancárias, mordomias de toda a ordem, carros topo de gama com chofer, dá direito a tratamento por sua excelência, etc, etc, etc.
São titulares destes cartões o Barão do Lila Dom Furão Barroso, a Baronesa do Terreiro Dona Expropriação Esteves e o Presidente da Fundação do Oriente Dom Staneloy Ho.
O cartão laranja-ouro, serviu para alavancar a carreira de muito boa gente, que sem o dito cujo nunca teria passado da cepa torta. Bons ordenados, reformas e mordomias nunca imaginadas ficaram ao alcance dos titulares deste cartão, cuja importância todavia se restringe às fronteiras do reino. É o cartão mais desejado pelos elementos da nomenclatura laranja, e muitos mantiveram-se militantes ao longo dos anos, na vã esperança de lhes tocar algum, mas poucos foram os escolhidos.
São titulares destes cartões o Presidente das Cortes Dom Juanito de La Bisabuela, o Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum, o Visconde de Celeirós Dom Toninho Castanheiros, o Visconde de Valverde Dom Vitinho Córócócó, o Cobrador Mor do Reino Dom Gigio, o Marquês de Calavinhos Dom Milkes Varredor, entre outros.
A grande maioria dos membros da nomenclatura é titular dos cartões laranja-prata. Têm algumas mordomias de forma escassa e espaçadas no tempo, são convidadas para alguns eventos mais importantes e para defender o partido nas horas difíceis, têm direito a uma ou outra merenda ocasional, sendo-lhes nessas ocasiões incutida a esperança raramente concretizada de virem a obter o cartão laranja-ouro. São titulares do cartão laranja-prata, o Visconde dos Cossacos Dom Pernache da Lousa, o Visconde de Jales Dom Tides Mais Branco não Há, o Marquês de Fonte Mercê Dom Tonho, o Barão de Vila do Pelo Dom Daniel sem Papel, a grande maioria dos alcaides, o Visconde da Régua Dom Farinheira Medes, o Conde de Paradela Dom Sebentino Melkes, o Visconde da Arreigada Dom António Barbarossa, o Conde de Argemil Dom Gualteriano Peixeira, etc, etc, etc.
Vem a seguir o cartão laranja-laranja, por muitos considerado o verdadeiro e puro cartão, cujos titulares são o povo crente e anónimo que ao longo dos anos com o voto tem sustentado esta classe politica e alguns que deram o litro, a saúde e até a própria vida, a troco de coisa nenhuma, com sejam o Dom Quintanilha da Triste Memória, o Duque de Argemil Dom Zé dos Diabos que chegou a ter assento nos órgãos nacionais, o Duque de Montenegro Dom Júlio da Abadia, e o filho do Visconde da Foz, Dom Julinho Pimentel.
Vem a seguir na ordem de importância o cartão laranja-rosa, cujos titulares são aqueles que mudaram de campo e de partido por motivos óbvios, como por exemplo, o irmão de Dom Caím Conde do Cutelo Melhor, o escriva do boletim oficial do reino Dom Quixote de La Silva e outra figuras menores.
No fim da escala está o cartão laranja-ás-riscas, ou como diz o povo “cor de burro a fugir”, cujos titulares são “personas não gratas” dentro do partido, mas que teimam em continuar apesar da grande maioria dos militantes os quererem ver pelas costas. Entre outros são titulares deste cartão o Marquês de Viagreta Dom Geninho Três Ais, e o Visconde de Alfarelos filho de El rei Dom João VI.



PS: O Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum, numa das inúmeras entrevistas que tem dado ultimamente, eximindo-se de qualquer responsabilidade na crise que atravessamos e fazendo um balanço da sua longa passagem pelo poder, disse que augura um futuro brilhante para o reino de Valdecacos.
Todos nós gostaríamos de acreditar nisso, mas o problema é que o Dom Xico Mirandum é um personagem por todos nós conhecido há demasiados anos, e todos nós sabemos que em termos de ordem politica a verdade é “coisa que não lhe assiste”.


Até Breve

Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 20 de Abril de 2012

sexta-feira, 13 de abril de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE

Depois de um périplo por alguns reinos europeus, aonde fui à procura de condições de trabalho, pois as coisas por aqui estão cada vez mais difíceis e complicadas com austeridade em cima de austeridade, os políticos comem-nos mais de metade da jorna que com sangue suor e lágrimas vamos conseguindo angariar, e o que resta dificilmente dá para levarmos uma vida digna e acima de tudo perspectivarmos um futuro para os nossos filhos.
De modo que, seguindo os conselhos do chefe do governo do condado Portucalense Dom Passos Guedelho, há que preparar o salto e emigrar, coisa a que os habitantes do reino de Valdecacos já estão mais que habituados, pois infelizmente a crise na nossa terra não começou em 2008, mas já vem de longa data, provocada por politicas erradas de desenvolvimento, em que se privilegiaram as obras de fachada, o caciquismo eleitoral, o fogo de artificio, em beneficio dum partido que nos governa há mais de trinta anos, e que levou à debandada da maioria da população, que não enche a barriga de passeios com pedrinhas e lancis de granito, nem de quatros pavilhões multidesuso, nem de cinco ou seis pavilhões gimnodesportivos, nem de trinta ou quarenta campos de futebol onde já nem as ovelhas vão por causa da seca, nem de meia dúzia de monumentos de gosto duvidoso, nem de inúmeras estradecas alternativas para aldeias despovoadas e que já tinham acesso condigno, nem de prédios cheios de habitações vazias, nem de centenas de lojas encerradas, nem de comércios falidos, nem de piscinas fechadas, nem de bibliotecas inauguradas para “inglês ver”, nem de feiras que deviam promover produtos e apenas promovem políticos, com um modelo completamente esgotado que não serviram para nada em termos de desenvolvimento agroindustrial, etc, etc, etc…
Este é um reino sem futuro para os jovens, ou quando muito terá futuro para meia dúzia com cartão laranja. Os únicos que vão sobrevivendo são os subsidiados (os que necessitam e os profissionais do subsidio, sendo esta segunda categoria muito mais numerosa) e os velhos, ou idosos como agora se diz, que são a larga maioria do povo, já sem forças para emigrar depois de uma vida difícil comendo o pão que o diabo amassou, vão vegetando no dia-a-dia amparados pela pensão da segurança social, que o governo local complementa com os “afectos” em troca do voto quadrienal.
Quando cheguei do reino do Luxemburgo havia uma notícia em todos os media do condado Portucalense referindo a nomeação pelo Vaticano de um novo Cardeal, sendo a primeira vez numa história de quase mil anos que o condado Portucalense tem três Cardeais. Esqueceram-se do reino de Valdecacos e do nosso Cardeal Mazzarino, que é de longe o decano dos Cardeais, pois há mais de trinta anos exerce, manipula, influencia, conspira e intriga junto do poder. A nova eleição para a comissão de pais, que teve de ser repetida por ordem do tribunal, foi novamente engendrada pelo Cardeal Mazzarino, que pôs toda a maquina eleitoral laranja ao serviço do protegido, embora de uma maneira mais discreta, viram-se ao longo da tarde eleitoral alguns alcaides a transportar pais e encarregados de educação, prontos a votar às ordens do Cardeal Mazzarino, mas pouco dispostos a apoiar a escola ou os educandos no que a esta diz respeito. Os professores de outros reinos que vieram supervisionar o acto eleitoral, ficaram impressionadíssimos com a mobilização e com o interesse dos pais e encarregados de educação, afirmando que nunca tinham assistido a nada de semelhante! Pois com toda esta mobilização e entusiasmo e com a previsível nomeação do novo director que será o mesmo de antigamente, de certeza que iremos ter a nossa escola classificada entre as dez primeiras do ranking nacional como aliás sempre tem acontecido…
O Cardeal Mazzarino orgulha-se de nunca ter perdido uma eleição em que se tivesse envolvido ou uma jogada política em que tivesse participado.
Hoje, estou convencido que a tentativa de por o Barão de Ferreiros Dom Xico Mirandum à frente da Confraria, falhou porque o Cardeal Mazzarino não foi o protagonista da história, e como tal não só não se empenhou, como minou algumas pedras base como tão bem ele sabe fazer!



PS: Jules Mazarin, nascido Giulio Raimondo Mazzarino e conhecido como Cardeal Mazzarino, nasceu em Pescina no reino de Nápoles no dia 14-07-1602 e morreu em Vincennes, França a 09-03-1661. Foi ordenado Cardeal em 1641 sem nunca ter sido ordenado Padre. Foi nomeado sucessor do Cardeal Richelieu e após a morte de Luis XIII tornou-se 1º Ministro de França.
Hábil, refinado e astuto, desligando-se do Vaticano tornou-se em pouco tempo senhor absoluto da França. Deixou vários escritos políticos, dos quais retiro a seguinte frase “ dissimulador é aquele que ora censura ora recomenda uma mesma atitude, conforme lhe vem ou cai melhor”.



Até Breve

Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 16 de Março de 2012


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

CRÓNICAS DO REINO IV SÉRIE


Lá para os lados do oriente existiu um reino situado em terras da Mesopotâmia, palavra cujo significado etimológico é, no meio dos rios, cujos nomes são o Tigre e o Eufrates, terras férteis e generosas, onde o maná e mel corriam com abundância e onde os historiadores situam o berço de todas a civilizações.
Pois foi por lá, nesse reino de sultões e de califas, frequentemente atravessado por caravanas que do extremo oriente traziam as sedas e as especiarias, o ouro o incenso e a mirra, que se formou uma quadrilha de 40 ladrões, que assaltavam as caravanas e guardavam os tesouros roubados numa gruta, em cuja entrada havia um enorme rochedo que se abria quando as palavras mágicas “abre-te sésamo” eram pronunciadas.
Ora um belo dia, andando por ali a apascentar meia dúzia de cabras, um belo, simpático e pobre rapaz chamado Ali Baba, ouvindo chegar no meio de grande poeirada os 40 ladrões montados nos seus camelos com o produto do roubo, escondeu-se e ouviu as palavras mágicas que abriram a gruta. Quando os ladrões se foram embora, o Ali Baba dirigiu-se à entrada da gruta, gritou “abre-te sésamo”, viu o rochedo abrir-se e lá dentro encontrou o maior dos tesouros que um homem pode imaginar e que o transformaram num aventureiro romântico e protagonista de inúmeras peripécias.
No reino de Valdecacos, temos uma instituição há muitos e muitos anos governada por um Ali Baba e 40 figurões, mas em contraponto com o lado romântico e aventureiro do Ali Baba do oriente, o Ali Baba de Valdecacos, é um personagem com um ar sinistro e um passado tenebroso, de carnes balofas e um cumprimento húmido e pegajoso que provoca arrepios. Os 40 figurões, ao longo dos anos e rotativamente, são convidados, manipulados, usados, comprometidos e descartados quando aprendem demasiado.
Tantas e tão poucas o Ali Baba foi aprontando ao longo dos tempos, umas com menos e outras de maior gravidade que a sua posição se tornou insustentável, as carradas e carradas de presuntos, salpicões, linguiças, alheiras e vinho, já não convencem ninguém, e as pressões foram de tal ordem que o Ali Baba teve de abdicar mas ficaram os 40 figurões, alguns com uma escola pouco recomendável, o que não augura nada de bom, outros não tão mal intencionados mas que dizem a tudo que sim, a troco de uma merenda gratuita.
O Ali Há Latas, ligado aos negócios estrangeiros, há longos anos residente no reino da Flávia embora nado e criado no reino de Valdecacos, foi a personagem escolhida para substituir o Ali Baba. Homem de personalidade forte, com um passado combativo e impoluto, esperemos que entre na gruta dos tesouros e mude as palavras mágicas mas não as revele a ninguém, caso contrário pela calada da noite quando se encontrar na Flávia a descansar, os que agora vão embora contra a vontade, voltarão para continuar a fazer aquilo em que estão viciados e todos sabemos como é grande a força do vício.
Teremos então mudança e ruptura com um passado que nos envergonha a todos, ou tudo isto não passará de uma encenação para esconder os podres que todos sabemos que existem e que se não forem erradicados, acabarão por contaminar mesmo o melhor dos intencionados?
Cuidado Ali Há Latas! No melhor pano cai a nódoa, e a gruta que durante tantos e tantos anos o Ali Baba considerou como sua, está cheia de lâmpadas de Aladino, mas estas com génios do mal embebidos numa gordura peçonhenta e mal cheirosa, cuja nódoa quando cai mesmo no melhor dos panos, é praticamente impossível de tirar.

Até Breve

Publicado no Jornal "Tribuna Valpacense" em 02 de dezembro de 2011