Estas crónicas alimentaram-se
durante quase trinta anos nas peripécias de um pequeno personagem que o Marquês
de Croft Dom Manolo Primo de Rivero apelidou com alguma ironia de Tamagoshi,
devido à sua pequena estatura, ao bigodito que acabou por sacrificar por
motivos de ordem eleitoral, e à maneira rápida e cadenciada de ler os
discursos, com um certo acento nipónico que deixava o povo de boca aberta e
olhos arregalados de espanto pois não entendia absolutamente nada, facto esse
que acabou por beneficia-lo em termos eleitorais, pois como todos sabemos os
discursos dos políticos não são para entender mas sim para aplaudir.
É pois para mim extremamente
difícil continuar a escrever as cronicas do reino sem ver diante dos olhos o
japonesinho irrequieto e irrascível, que durante tantos e tantos anos foi fonte
de inspiração e de brincadeira inocente, pontuada de quando em vez por uma
certa picardia como convém nestas situações.
Estou pois seriamente a pensar
por um fim nas crónicas do reino, também me sinto no direito a um merecido
descanso, quem sabe rumar ao nordeste do reino do Brasil, comprar uma cabana de
pescadores numa daquelas praias paradisíacas, refrescar-me com uma água de
coco, degustando camarão frito e umas patas de siri, subindo e descendo as
dunas e as bundas, que naquela região são das mais bonitas do mundo.
È este o sentimento que me invade
o coração e me amolece a alma! A partida do Barão de Ferreiros deixou-me esta
imensa nostalgia e não me parece que qualquer dos outros personagens da
aristocracia do reino de Valdecacos, consiga preencher este vazio deixado por
Dom Xico Mirandum.
O Barão de Ferreiros conduziu o
reino de Valdecacos ao sec.XXI da mesma maneira que se conduz o comboio numa
montanha russa. A viagem tal como os discursos foi rápida e acidentada, com
voltas reviravoltas e rodopios tal como convém numa montanha russa, mas sempre
dentro dos carris que volta após volta apontavam sempre na direção da eleição
seguinte.
Ano após ano, volta após volta,
eleição após eleição, lá conduziu o Barão de Ferreiros o comboio, serra a cima
montanha abaixo, o povo de início como era novidade gritava de contentamento
com a velocidade imprimida, as curvas apertadas, as descidas rápidas e as
voltas de cabeça para baixo. Depois começou a cansar-se de andar com a cabeça à
roda, e os mais novos começaram a saltar do comboio em andamento arriscando a
própria vida, outros não puseram cinto de segurança e foram cuspidos, e quando
Dom Xico Mirandum deu conta mais de metade da população tinha abandonado o
comboio e envergonhado com isso, decidiu abandoná-lo também. Entregou o posto
de maquinista ao homem do carvão, que durante os anos de viagem não fez outra
coisa senão obedecer ao Barão de Ferreiros, que no final de cada volta lhe ordenava
alto e bom som “bota carvão à máquina”.
E o comboio lá continua agora sem
maquinista e também mais devagar que o habitual pois o carvão vais escasseando
e já não tem a mesma qualidade. De vez em quando ouve-se uma voz no meio da
populaça dizer para o homem do carvão “bota
carvão à máquina”, e o homem do carvão já cansado e a pensar que ainda tem
de “botar carvão à máquina” durante
mais dois anos e que o novo maquinista em vez de ser ele vai ser o calcinhas do
revisor.
Até Breve
Publicado no jornal "Tribuna Valpacense" em 01 Março de 2013